quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Emprego XXI: Um novo significado (I de II)

(I de II): A precarização do valor do trabalho.

Na sociedade moderna o trabalho - remunerado ou não - sempre constituiu uma permanente forma de expressão e de reconhecimento da nossa utilidade na sociedade. Com ele afirmamos a nossa dignidade e nos diferenciamos com os nossos talentos. Através dele atingimos novos graus de emancipação e autonomia e com ele nos integramos nas nossas comunidades. É ainda através do trabalho que nos empossamos de satisfazer grande parte das nossas necessidades e desejos.
Todavia, não param as evoluções quanto ao modo como consideramos o trabalho, o estar-se empregado ou o estar-se ocupado.

Vários factores de ordem económica e social fizeram com que nos últimos decénios a produção industrial tenha sido substituída pela promoção comercial enquanto principal preocupação de uma empresa. Hoje é o marketing que domina a estratégia empresarial num mundo extremamente competitivo em que quem lucra não é quem consegue produzir mais mas sim quem melhor responde aos anseios do cliente. Enquanto que o tradicional taylorismo desmembrou o trabalho em acções individualizadas passíveis de padronização e remuneração colocando todo o ênfase competitivo na eficácia produtiva, este salto económico levou as empresas a dependerem sobretudo da sua capacidade de inovar e de se adaptar a novos tempos e tendências.

Ora se no século XX, o século do taylorismo e do fordismo mecanizado, as valias do trabalhador dependiam da solidez e estabilidade das suas competências e comportamentos, exigidas até pela lógica das linhas de produção, no novo milénio o novo modelo empresarial da inovação e adaptação passou a exigir trabalhadores mais qualificados e capazes de acompanhar as mudanças necessárias. Assim as empresas passaram progressivamente a promover e a valorizar a polivalência e a versatilidade das pessoas e a introduzir gradualmente uma cultura de flexibilidade.

De seguida aborda-se relação entre a precariedade laboral e a evolução do assistencialismo estatal e a sucessiva instalação de direitos laborais.
Tendencialmente o estado social disponibiliza protecções sociais na forma de subsídios monetários, regalias e serviços subsidiados que reduzem a percepção da importância do emprego enquanto garante do progresso e da segurança material do indivíduo. Sem prejuízo dos benefícios da solidariedade e da protecção no desemprego, é facto que o trabalho remunerado tem perdido algum do seu encanto enquanto forma privilegiada de participação na vida social.
A redução de necessidade do emprego faz com que também o desemprego tenha perdido algum do seu drama e de facto auto-estimula-se. Instituições como o subsídio de desemprego faz com que as pessoas estejam dispostas a esperar mais tempo por um emprego que realmente lhes agrade.

Aliás, os últimos progressos do estado social promovem inadvertidamente algum enfraquecimento dos valores socialmente construtivos que emanam do trabalho. O economista Abel Mateus justifica que quanto mais elevados são os custos de despedimento mais os recursos humanos estão detidos em sectores de tecnologia obsoleta ou de baixa produtividade por mais longo tempo. Isto significa que, à parte das implicações económicas, a retenção de trabalhadores por motivações mais administrativas que técnicas, despoleta uma desmoralização generalizada e um descrédito no trabalho em si, composta por uma redução da afeição (dos trabalhadores) e do reconhecimento (por empregadores).

Se antes os patrões despediam a seu belo prazer, também contratavam com grande à vontade.
Já nos dias de hoje, a regulação trouxe um maior receio de firmar compromisso com novos
trabalhadores, e faz sobressair nos patrões uma desconfiança maior sobre os contratos existentes - precariedade laboral.

Do outro lado da barreira os empregados não são insensíveis a isto e as suas ambições/preocupações enquanto empregado deslocam-se do bom desempenho para o bom “agradamento”, a par de um maior receio de ser despedido – mais precariedade laboral.

A precariedade gerada pela flexibilidade não mudou apenas a percepção das pessoas sobre o trabalho remunerado. Também as relações e comportamentos sociais têm sofrido alterações. Com a redução do tempo médio de permanência no mesmo trabalho (mesmo local, mesmo posto, mesma função ou mesma empresa), os laços sociais que a ocupação laboral proporcionava directamente diminuíram de intensidade e de frequência...

continua...

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