sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Impacto da Globalização III de III

A aldeia global.

Da mesma forma involuntária que os insectos polinizam as plantas por todo um território, o turismo, os mídia, o comércio ou a internet são as principais locomotivas transportadoras de cultura e de efeitos a todo o mundo. Este transporte é compulsivo e incontrolável. Uma empresa por exemplo pode incutir deliberadamente uma ideia ou publicitar uma marca, mas os efeitos que produz são muitos mais que isso...

Independentemente da sua escala todos os efeitos são globais
porque todas as acções e inacções são passíveis de interagir com todos. tomemos como exemplo uma mera opção de consumir uma peça de vestuário X na loja Y. Isto pode significar mais uma venda para a lojista e uma pequena influência na comunidade local, mas devido à cadeia de produção globalizada, a toda a logística envolvida e o próprio ciclo de vida do produto, essa opção contribui garantidamente para sucessos em partes diferentes do mundo e insucessos noutras.

De facto, posto de outra perspectiva os efeitos individuais fazem-se valer mais ainda por via da necessidade empresarial imposta pela globalização democrática e económica. Nos últimos decénios assistimos à insurreição do cidadão consumidor como formulador das políticas e dos mercados. Na política através do voto democrático e no mercado através da influência nos estudos de mercado, os indivíduos repercutem, não através das suas vontades mas através dos seus actos e hábitos, tendências e pressões estatísticas que mobilizam decisões em níveis até socialmente bastante afastados.

Como qualquer comunidade, a global contempla graves problemas de exclusão e desigualdade com a agravante de neste patamar haver bem menos controlo e governo do que ao nível de um país por exemplo. Esta noção não reduz os problemas das comunidades locais, mas tal como na questão da identidade, retira atenção abrindo o leque de comparações.
Uma forma de ilustrar esta relativização global pode ser dado com o facto de em função de ser conhecido e constantemente reforçado que existem milhões de pessoas no mundo que passam fome diariamente ou milhões de pessoas que morrem de doenças facilmente tratáveis, o problema do vizinho búlgaro com algumas carências económicas ou o do pastor belga abandonado são problemas que perdem o sentido de o ser. Aliás, constata-se ser crescente o paradoxo de quanto maior capacidade de interacção maior se verifica o alheamento social. Da mesma forma que a sociabilidade das pessoas numa aldeia do interior é muito mais intensa e concentrada do que numa grande cidade no litoral, o mundo globalizado é rico em isolamento individual e secundarização de preocupações.


Com a globalização a retirar ênfase à sociabilidade e verificando que o nível de socialização diminui com a diminuição da sua procura (leia-se necessidade), os seres humanos desafiam a sua génese de animais sociais incorporando novos hábitos (problemas) na sociedade como a solidão social, exageros de desatenção civil, baixa auto-estima ou sentimentos de inutilidade, fenómenos indutores de distúrbios depressivos e que alimentam o ciclo vicioso da perda de sociabilidade...

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Impacto da Globalização II de III

O dia-a-dia globalizado.

A ilustração anterior encontra-se nas vivências do dia-a-dia por toda a parte. Tomando Portugal como exemplo, um país historicamente associado ao fenómeno, dos descobrimentos à diáspora, das relações diplomatas à indústria turística, é um país que tem acompanhado abertamente o fenómeno sem choques e sem frustrações. Aliás, a própria identidade da nação portuguesa engloba características como a multiculturalidade ou miscigenação, termos caros aos mais receosos da tal perca de identidade.

O turismo - principal indústria exportadora do país - expandiu-se nos últimos decénios suportado por determinantes de estabilidade globalizadas e hoje um simples passeio na rua pode representar parte de um produto turístico aos olhos de eventuais visitantes de uma qualquer parte do globo. Do mesmo modo, uma simples visita de um estrangeiro ao nosso restaurante habitual pode despertar novas noções particulares de elegância ou etiqueta, ou a curiosidade sobre toda uma comunidade.

A globalização é isso mesmo, interagir e estabelecer relações globalmente, tanto numa óptica de negócio como de socialização. Nunca tanto como hoje se nos preocupa mais o que acontece “lá fora” nem o que acontece cá preocupa tanto “lá fora”. Ao ligarmos o televisor notícias de outros países invadem-nos os ecrãs com semelhante proximidade às notícias da cidade vizinha. Porque se emocionaram tantos portugueses com a história dos mineiros chilenos presos no subsolo? – Porque se estabeleceram ligações em que os mineiros eram sentidos como vítimas humanas mais do que desconhecidos estrangeiros.
Claro que tais ligações não seriam possíveis sem os meios de comunicação, mas estes não estabelecem o propósito. Apenas nós, os indivíduos temos o poder de constituir relações sociais. Nestas, por mais hábeis ou manipulativos que sejam, a comunicação social nunca será mais que o veículo, o pombo-correio de atitudes e comportamentos de pessoas.
No caso dos alimentos, a globalização do comércio tornou acessíveis alimentos que eram inacessíveis e restritos a uma época, o que possibilitou criarmos novos hábitos alimentares. Nas compras do supermercado interagimos com povos diferentes só de olhar para rótulos e embalagens de produtos provenientes de outras origens. Fazemos identificações, comparamos e assimilamos dados sobre determinado produto, marca ou país, e com isso adicionamos riqueza à nossa identidade. É real. É natural. E é síncrono.

As mais recentes tecnologias inovadoras são produzidas em países diferentes dos que as desenvolveram, e estão disponíveis por lojas de todo o mundo a preços semelhantes (ainda que o poder de compra difira de país para país). Com a internet expomo-nos e transmitimos informações a milhões de utilizadores, e estabelecemos contacto sem fronteiras com uma outra pessoa num chat em tempo real ou com a simples visualização de uma publicação.
À parte da linguagem que determina a qualidade da comunicação, praticamente não existem diferenças de dificuldade em estabelecer contacto baseadas na localização, etnia ou status social. Ou seja, na sociedade da informação globalizada, todos estão à mesma distância.

Se todos interagimos, todos trocamos influências. E neste ambiente torna-se muito mais frequente, fácil e rápido propagar as modas e as ideias de um só indivíduo ou de uma só comunidade. O mesmo para drogas ou ideias fundamentalistas.

...Continua