terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O vírus da Crise!

Quando o capitalismo contrái a gripe, manda a precaução que nos afastemos do seu contágio.
E é exactamente neste período de choco que nos encontramos na actualidade.

Desde que o Homem usa do dinheiro para controlar as suas vidas, que existem altos e baixos na prosperidade social. Uns mais repentinos que outros.
Antes estivéssemos novamente em crise repentina pois dela poder-se-ia usufruir dos efeitos do choque, e com isso dar-se passos demarcados para um futuro adaptado.

Basta olharmos para o século findo para percebermos que foi uma crise prolongada que instituíu o salazarismo, mas não foi nenhuma que nos tirou dele.

E se hoje um novo Salazar se insurgisse, seria corrido no mesmo instante - Efeito da râ cozida - Se colocarmos uma râ num tacho com água a ferver, ela salta de imediato, mas se a colocarmos em água morna, e a aquecermos em lume brando, a rã acaba cozida por nunca ter sentido "choque".

Tal como revoltas modernizam mentalidades, ou como o guerrear potencia a ciência, é do choque que se obtem as grandes transformações!


2009 Será ano de choque?
Será com certeza outro ano engripado com a crise!
E como qualquer outra gripe, temos as mezinhas:
Temos um governo que dá subsídio de desemprego directamente às empresas para não constarem das estatísticas. Que oferece uns milhares de euros por cada novo posto de trabalho para que as empresas façam Sócrates cumprir a promessa dos 150mil. Salva-se as solvências privadas com dinheiros públicos e ainda há quem lucre com isso! Permite-se o constante agravamento da dívida pública e fala-se em "margens de manobra".

Que Doutores são estes que nos dão tais prescrições?
Não há direito a segunda opinião?!...

Todos nós sabemos que as mezinhas curam constipações e amenizam as gripes... Mas se nada mais for feito, no próximo Inverno cá estaremos a expirrar novamente!

Estaremos todos condenados à constipação eterna?
Quem está engripado são todos os que não se agasalharam.
As economias emergentes cuja economia se baseia na produção real e não na especulação virtual, só sofre alguma crise porque as economias ditas "emergidas" estão mais reticentes em comprar.
São o medo e a desconfiança que descem as compras, e é por essa via que as emergentes sofrem o que sofrem.

Portugal, que nem sabe produzir nem sabe especular, vai atrás das modas desde a revolução francesa.
Usa vacinas certas contra estirpes erradas. Portugal não é um outro país. Portugal não é o mesmo nem sofre as mesmas patologias que a Europa ou os Estados Unidos. Cada cura tem que ser tratada no plano a que compreende. E notoriamente, Portugal não está a cuidar de si!


A melhor cura?
Ninguém está imune á gripe em todas as estirpes. E ainda que hajam corpos mais fortes, mais Inverno menos Inverno o nariz pingará.
É assim o capitalismo, a lei do mercado prevê altos e baixos, sucessos e falências. E se ainda vivemos neste modelo pela ideia de não haver outro excepto utopias, que seja! Mas que saibamos tirar proveito desse modelo.

Que tenhamos à mão um bom sobretudo quando as temperaturas baixam. Que tenhamos atenção às diferenças térmicas. Que evitemos mais as economias doentes e nos acerque-mos das sãs.
Com tanta prevenção por fazer, deixemo-nos de caprichos políticos ou investimentos à moda dos outros e apostemos no que interessa!


Esta crise só agora começa a aqueçer, sem o choque para nos ajudar, ou saltamos pela nossa inteligência, ou cozemo-nos na ignorância...

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

10 de Dezembro - Dia Internacional dos Direitos Humanos

Os direitos humanos representam para uns, os direitos naturais do ser humano, para outros o conjunto normativo que resguarda os direitos dos cidadãos.

Em qualquer dos casos, hoje, Dia Nacional (desde 1998) e Internacional (ONU, desde 1950) dos Direitos Humanos, nunca é demais relevar a importância de uma das maiores autoridades históricas neste delicado tema - O grande mestre Padre António Vieira (em cima, foto do memorial inaugurado no passado 6 de Fevereiro na Calçada do Correio Velho, em Lisboa).

Aqui fica o óptimo artigo de Marco Maciel, senador (DEM-PE) e membro da Academia Brasileira de Letras, publicado hoje na imprensa brasileira:


«Padre Vieira e os direitos humanos


“Os erros dos homens não provêm apenas da ignorância, mas principalmente da paixão.
A paixão é a que erra, a paixão a que os engana, a paixão a que lhes perturba e troca as espécies para que vejam umas coisas por outras. Os olhos vêm pelo coração e assim como quem vê por vidros de diversas cores, todas as coisas lhe parecem daquela cor assim as vistas se tingem dos mesmos humores, de que estão bem ou mal, afetos os corações.” Essas são palavras do padre Antônio Vieira no Sermão da Quinta Quarta-Feira da Quaresma de 1669. Pascal, um século depois, repetiria o mesmo pensamento com exemplar concisão: “O coração tem razões que a própria razão desconhece.”

Não se pode deixar de ressaltar como característica primordial do padre Vieira a simbiose aparentemente contraditória do orador sacro com o político. Seus sermões, sobremodo, foram utilizados como veículo de propagação sacerdotal-missionária dos preceitos evangélicos e coincidiam com a patriótica solução de problemas múltiplos, socioeconômicos em especial, em favor de sua pátria-mãe e de suas colônias.

A propósito, no instante em que se faz memória da passagem do quarto centenário do nascimento do padre Antônio Vieira e em que se celebra a passagem dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, impõe-se dar ênfase ao obstinado papel que exerceu o padre Vieira na defesa dos índios, negros, escravos, cristãos-novos e judeus.

Vale salientar, nesse contexto, duas lúcidas constatações do embaixador de Portugal no Brasil, Francisco Seixas da Costa, em suas Palavras liminares, registradas no livro Traços Marcantes da Vida e Obra do Pe. Antônio Vieira, de autoria do padre e professor da Universidade de Brasília (UnB) José Carlos Brandi Aleixo: “Quando também agora se assinalam os 200 anos da presença da corte portuguesa, cabe lembrar que a idéia de deslocação da capital do Império para o Brasil havia sido aventada por Vieira bem antes de 1808, pelo que talvez também lhe deva caber parte do mérito de empreendimento fundacional da modernidade brasileira”; e “num tempo em que a ética pública atenta cada vez mais para as questões dos Direitos Humanos, mais notável se torna a presciência de Antonio Vieira ao adiantar, na humanidade de seu verbo, muitas das preocupações que agora nos são comuns, mas que, à época, representavam uma nem sempre confortável visão antes do tempo.”

Clóvis Bulcão, historiador e escritor de romances históricos, ao se reportar à presença da comunidade judaica do Recife no período da ocupação holandesa, registra a atuação de Vieira entre os cristãos-novos, então muito discriminados, e o inclui como o primeiro, à época, a falar da convivência dos cristãos e judeus. Da mesma forma, anota o historiador, Vieira considerava a catequese dos índios como a única maneira de conquistar a região amazônica.

De 1652 a 1661, atuou Vieira como missionário no Maranhão, empunhando a defesa dos índios - e o fazia do púlpito, que, segundo o padre e professor da UnB José Carlos Aleixo, era considerado por Vieira “a única tribuna independente, perante a autoridade civil, para expressar agravos populares”. De lá foi expulso, juntamente com os demais jesuítas, pelos moradores que se sentiram prejudicados pela alforria dos indígenas daquele regime escravocrata que lhes vinham impondo.

Dotado de personalidade riquíssima e de aspectos aparentemente contraditórios, Vieira - catequista de indígenas, pregador jesuíta, orador em cortes européias, missionário, professor de Humanidades e de Filosofia, homem de Estado, pensador de larga visão, de enorme atividade epistolar e arguto ator em política externa, diplomata-síntese de sua época - foi, igualmente, “o mestre da prosa portuguesa clássica”, consoante a definição precisa do professor Rubem Queiroz Cobra.

Deixou-nos Vieira por volta de 200 sermões eminentemente originais. Entretanto, o que mais causa admiração é o zelo religioso de seu talento como orador sacro, vazado num estilo tão contundente que a mera leitura de seus textos nos faz revisualizar, ainda hoje, a imagem dinâmica de seus gestos no púlpito e ouvir-lhe a voz tonitruante.

Essa exuberante demonstração de criatividade foi naturalmente haurida na Ratio Studiorum dos jesuítas, toda calcada na filosofia de Aristóteles, na teologia de Santo Tomás de Aquino e nas humanidades clássicas das maiores sumidades greco-romanas. Não são de admirar, assim, suas metáforas, alegorias e inesperadas comparações, que não dispensavam o paradoxo - como no Sermão do Santíssimo. Sacramento (1645). “Milagres feitos devagar são obras da natureza: obras da natureza feitas depressa são milagres.” Nem é de estranhar mais esta outra, extraída do Sermão da Epifania (1662). “O estilo era que o pregador explicasse o Evangelho: hoje o Evangelho há de ser a explicação do pregador. Não sou eu o que hei de comentar o Evangelho: o texto é o que me há de comentar a mim. Nenhuma palavra direi que não seja sua, porque nenhuma cláusula tem que não seja minha. Eu repetirei as suas vozes, ele bradará os meus silêncios.”

Concluo com o poeta Fernando Pessoa:

“O céu estrela o azul e tem grandeza

Este, que teve a fama e a glória tem,

Imperador da língua portuguesa,

Foi-nos um céu também.”

Essas palavras, inseridas na Obra Poética do maior vate de Portugal no século passado, expressam o reconhecimento ao padre Antônio Vieira, cidadão de dois mundos - autêntico luso-brasileiro -, pois nele se associam utopia e ação e, em plena harmonia, fé e atividade missionária.»