A residência pessoal, por seu turno, representa hoje mais um complexo gerador de limites e menos um abrigo seguro e estável. Se o “trabalho para a vida” era um marco de estabilidade, a “residência para a vida” era uma certeza.
Contudo, hoje o emprego está a deixar de ser um dado adquirido, e, de uma espécie de rito de iniciação e permanência obrigatória na sociedade adulta, está a tornar-se numa frágil aventura composta por uma série de peripécias com percalços e reviravoltas ao longo da vida, facultativa para alguns.
Apesar disso, a flexibilidade da morada não tem acompanhado a flexibilidade laboral (sobretudo em Portugal onde o mercado de arrendamento não consegue competir com a cultura da casa própria), levando a que as deslocações casa-trabalho se tenham esticado na distância e no tempo dispendido.
Assim é hoje cada vez menos comum a edificação, por parte das fábricas, de “bairros operários” que consolidavam comunidades proletárias. Em vez disso, assiste-se ao aumento da desterritorialização das comunidades trabalhadoras.
A forte competição no mercado laboral aliada às progressivas facilidades de transportes e comunicações submetem as pessoas a trabalhar cada vez mais longe da sua residência abrindo mão de sentimentos afectivos para com o “local de trabalho” e respectiva comunidade local. A desconfiança e quezílias atingem as relações laborais ocupando o espaço consignado a sentimentos de partilha e de amizade em comunidade, prejudicando inclusive o desempenho da empresa e contribuindo indirectamente para mais precariedade.
A contrapor este ciclo vicioso, a protecção do trabalhador e a regulação do trabalho remunerado trouxe limites ao egoísmo com que uma empresa podia usar e dispor da força de trabalho, convidando à constante concertação entre partes. Aliás, as necessidades de inovação e adaptabilidade impostas ao panorama empresarial reflectem-se dentro das organizações resultando em maior frequência de actualização o que as obriga a um mais intenso relacionamento entre gestores e geridos numa perspectiva de interdependência.
Assim, ultrapassada a primazia do taylorismo e da indústria de massas, a perspectiva pós-fordista veio reposicionar o trabalhador para dentro do espírito da empresa, deixando a mão-de-obra de ser uma matéria-prima ou uma mera ferramenta para passar a ser as mãos, os braços e os próprios sentidos da organização (influenciando directamente as decisões e políticas empresariais dos patrões).
A população activa está numa tendência de envelhecimento (muito devido ao envelhecimento generalizado da população portuguesa), mas se na população de idade mais avançada as mudanças pró-flexibilidade lhes parecem inimigas, para os jovens o “choque” é mais abrangente.
As gerações que recentemente iniciaram a sua vida activa foram instruídas com a experiência dos seus familiares e amigos mais próximos, em especial os pais. Mas no actual mercado laboral já não há lugar para a figura tradicional do “chefe de família” dos tempos em que era comum a remuneração de um dos elementos do casal suprir as despesas do agregado. Hoje tanto os homens como as mulheres, cujas diferenças no mercado de emprego decrescem a passos largos, querem e podem aspirar a carreiras profissionais longas, independentemente do ramo.
Se antes a generalidade das pessoas ocupava a vida na profissão com que iniciara a vida activa a ela ficavam intrinsecamente associadas e com elas eram identificadas pelas comunidades, nas novas gerações isso é excepção.
Estamos longe das taxas de desemprego de 3,9% (2000) e hoje com recordes de desemprego, a competição pelo emprego tornou-se mais concorrida, mais complexa e mais exigente, tanto quanto mais qualificação o posto de trabalho requerer.
Mas apesar da crescente frustração na população recém-licenciada, os estudos universitários continuam a compensar bastante para a empregabilidade. Em 2009 por exemplo, a taxa global de desemprego foi de 9,5% enquanto que para a população com um diploma do ensino superior foi de 6,4%. Também ao nível das remunerações a qualificação compensa: os quadros superiores auferem cerca de quatro vezes mais que os trabalhadores não qualificados.
Em suma, é justo dizer que se para as gerações anteriores o diploma era tido como um privilégio de poucos, em pleno século XXI é um requisito universal...
Licenciados ou não, os jovens estão cada vez mais aflitos. Porém não seremos deolindamente parvos por procurarmos formação. As universidades nunca existiram para garantir empregos mas para formar mentes e espíritos capazes de ser e de produzir o que antes lhes era miragem.
O problema do (des)emprego é económico. Quando a universidade se tornar numa mera casa de formação profissional, haverá outro reduto da busca do conhecimento e respeito pela identidade humana?